"Quando
Baltasar entra em casa, ouve o murmúrio que vem da cozinha, é a voz
da mãe, a voz de Blimunda, ora uma, ora outra, mal de conhecem e tem
tanto pra dizer, é a grande interminável conversa das mulheres,
parece coisa nenhuma, isto pensam os homens, nem eles imaginam que
esta conversa é que segura o mundo na sua órbita, não fosse
falarem as mulheres umas com as outras, já os homens teriam perdido
o sentido da casa e do planeta."
Algumas
mulheres Adozindas (duas, vá) descobriram nestes últimos anos que
afinal a incerteza é o que temos de mais certo, por isso o que é
preciso é “ter muita calma e descontracção natural” e dar
valor ao que é realmente importante, porque, quanto a tudo o resto
não há grande forma de controlar.
Vem
isto na sequência daquela desorganização da minha ordem mundial
que provocou a história do casamento do Titi. Não que ele ou o seu
casamento tivessem qualquer culpa, nem nada que se pareça,
coitadinho do meu menino, mas é como se esse acontecimento tivesse
posto a mexer a roda dentada que, de situação estranha em situação
estranha, me levou a esta conclusão nos últimos tempos. Com maior
ou menor grau de obsessão ou perfeccionismo, tentamos (eu tentava)
levar a vida “direitinha”, fazer as coisas pela ordem certa, com
as condições certas; há coisas e pessoas que tomamos por
adquiridas, outras que consideramos impossíveis. Mas a verdade é
que não é nada assim. As nossas pessoas são muito mais frágeis do
que pensamos, as coisas boas podem vir de uma forma totalmente
inesperada, desorganizada e fora do tempo em que era suposto e as más
também têm uma tendência do caraças para nos apanhar de surpresa, vindas
do lado mais inesperado.
Parece
uma verdade de “La Palisse”, mas tenho que vos dizer para mim
perceber realmente o que isto significa foi uma verdadeira revelação
dos últimos tempos, talvez porque sempre vivi uma vida muito
protegida de tudo quanto eram os cataclismos habituais de tantas
outras vidas. Esperamos para ter filhos quando houver 'condições',
para comprar casa ou viver junto quando houver 'condições', para
casar quando houver 'condições', para mudar de vida, de terra ou de
trabalho quando houver 'condições' e tudo isto quando tivermos
também 'certezas'...
E
se a pessoa que achávamos que era para o resto da vida afinal não
for? Se aparecer o trabalho certo no sítio errado? O filho que não
estava planeado? A falta de estabilidade no trabalho quando mais
contávamos com ele? A pessoa certa para nós, que não encaixa em
nada do que tínhamos programado?
Há
que reconhecer e aproveitar as coisas boas, mesmo que não venham na
altura ou do lugar certos, e encontrar maneira de ultrapassar as más,
venham elas quando e de onde vierem. Sobretudo, fazer o que queremos,
mesmo que não encaixe nos planos. Mesmo que seja só mais uma
aventura e que tudo possa dar errado, porque as coisas que verdadeiramente contam afinal são
muito menos do que pensávamos.